sábado, 29 de junho de 2013

Mais um menino

Ô  menino levado! Levado como todo menino
Seus olhos só me diziam meninices
Não era preto, nem mulato, nem albino
Era café com leite, nem muito café, nem muito leite

***

Ô menino direito! Aprumado como era devido
Seus olhos só me diziam chatices
Não era preto, nem mulado, nem albino
Era de cor cinza, de enfeite

Cresceu - e como crescem rápido!
Virou rapaz magrelo, mas bonito, cabelo partido
Ainda não tinha seus quinze anos, era sabido
até onde ninguém interferia, até onde não era chato

Padeceu sob a luz do dia, ê tristeza.
Se quando criança era arteiro e lépido,
agora escrevia sua nova pobreza
De levado foi a direito, certo e cético

Começou a enamorar e atestar. Arranjar o visto alheio
Emitiu os sorrisos falsos, arrancados ou sintetizados
Tava no circo, na praça, na roça e  no rodeio
Era o menino direito.

Começou a sonhar, mas logo bichou-se
viu que não era desses, nunca foi, nem será
Ficou parado até crescer raiz. Ah! se amasse...
Amou a primeira e a beijou sem ardor, sem amar

E foi vivendo e vivendo até enfadar-se
Já não aguentava mais existir, fez mais força
foi quando olhou para o relógio e viu nesse
Que a hora que passa é o laço da forca

Devagarinho até pra se esganar, ô menino...
Fala pouco e quando fala sempre concorda
Discorda concordando, mas nunca apenas discorda
E pra que provocar, pra que cutucar e tocar o sino?

Solidão era sua sombra, acompanhava as raparigas
Menino direito, sabia como manobrar o carro
E se de repente anda muito na linha, arranja briga
"Ô, minha mãe, sou direito, não perfeito!"

Às vezes ele conhecia meninos tentados, olha só
Eram barulhentos, infelizes, ai que dó!
falavam demais, e se perdiam na confusão
enquanto o menino ficava parado apreciando a visão

como tudo em sua vida medíocre.
Ainda os chamava pelos seus nomes, os levados
Não percebia seu olhar tão míope
que entre eles era amado e apreciado

E o que não valia era sua pressa em ser alguém
Faltava entender que não existe menino direito
E que a vida é feita de poréns e não améns
E que se existe algo doloroso é algo não feito

Mas seu porém não permitiu-lhe ver a sua vida
Então de menino passou a homem, louvou
Viu um pouco da angústia, da existência sofrida
Provou do sexo e por fim, gozou

Um dia num lago e pela manhãzinha
Avistou um cisne que lembrou da época doce
Longe agora, das primeiras intrigas
Que permearam sua vida tosca

O cisne parou nas pedras, e ficaram essas 
Paradas... paradas... pois eram pedras.
E não pedras-humanas, aquilo que ele foi
Ele saía da frente quando alguém vinha passar, as pedras não.

O menino levado se lembrava bem
Era como uma bela estação de trem
Pois havia local mais adequado? 
Via o menino direito, ali parado.

Ele avançava e voltava. Ia, não ia
Pulava sem tirar os pés do chão
Empinava, gritava, sem abrir a boca; sorria
Quando no fim disso tudo, não saia do lugar

"Isso já não é mais de minha preocupação
Essa comoção, sensação de ilusão
Não faz parte do meu ser alienado de mim mesmo
Eu sei, isso não é coisa de homem direito"

***

Formou
Casou
Orou
Rezou
Chorou
Louvou
Negou
Julgou
Amansou a fera
Cuspiu na tela
Amaciou a terra
Domingou e os filhos criou

Ô menino, que fizeste tu com a tua vida? 
E por que insistes tanto na mesma ladainha?
Vem pro lado que te pertence, o lado da amizade e do de repente!

Olha pros olhos dos teus amigos e vê o perigo
De zombar deles quando mais precisam, 
De um amigo... de um menino

Levanta a tua mão!
Sem que peçam, apenas faze
Salva teu destino...

Solta as travas da vida
Faze dos amigos as emendas
Que mantêm as fivelas unidas

Não queiras ser o direito
Sê tu e já terás feito
Aquilo que mais desafia;
A tua esperada alforria

Vais então conseguir amar de verdade, e também serás amado.

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